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Alíquota de 50% imposta pelos EUA é ‘tiro no pé’, alertam economistas

Foto: Shealah Craighead/ The White House

A partir de 1º de agosto, os Estados Unidos passarão a aplicar uma alíquota de 50% sobre a importação de produtos brasileiros. A medida, anunciada pelo presidente Donald Trump, incide sobre itens como carne bovina, café, suco de laranja, frutas tropicais, aço e celulose — e afeta diretamente as cadeias do agronegócio nacional.

Segundo dados do ComexStat, os EUA foram o segundo maior destino das exportações brasileiras no primeiro semestre de 2025, respondendo por 12,1% do total. Economistas avaliam que, embora o impacto direto no PIB nacional seja moderado, a decisão americana pode provocar efeitos inflacionários dentro dos próprios Estados Unidos e obrigar o Brasil a reavaliar sua dependência comercial.

Para a economista Carla Beni, professora de MBA da Fundação Getulio Vargas (FGV), o termo técnico da medida importa: “Não se trata de uma tarifa, mas de uma alíquota sobre importação. E quem paga essa conta são os próprios americanos, não o produtor brasileiro”. Ela destaca que a alta nos preços dos alimentos pode pressionar o poder de compra da população e gerar instabilidade econômica nos EUA.

O doutor em economia pela FEA-USP e ex-economista-chefe da Federação Brasileira de Bancos (Febraban) e da Associação Brasileira de Bancos, Roberto Luis Troster vai além. Para ele, a medida é um “tiro no pé” da economia americana.

“Essas alíquotas penalizam os próprios EUA. Elas reduzem a competitividade das empresas locais que usam insumos do Brasil e aumentam o custo de vida da população.”

“Essa alíquota é um modelo ultrapassado de substituição de importações. Os EUA não têm capacidade de suprir internamente sua demanda por produtos como café ou suco de laranja no curto prazo. Resultado: preços sobem, a inflação aumenta, e o Federal Reserve (FED) pode ser forçado a rever sua política de juros”, afirma Troster.

Produtos agropecuários entre os mais afetados

Entre os produtos mais impactados pela medida estão os do setor agropecuário — especialmente carne bovina de dianteiro (usada na produção de hambúrgueres), café não torrado, sucos de frutas, celulose e couro.

Exportações brasileiras do agro aos EUA – 2025 (ComexStat):
Os dados a seguir mostram a participação de cada produto agropecuário no total das exportações brasileiras com destino aos Estados Unidos no primeiro semestre de 2025:

  • Café não torrado – 5,8%
  • Carne bovina fresca/refrigerada – 4,0%
  • Sucos de frutas ou vegetais – 3,7%
  • Celulose – 3,6%
  • Açúcares e melaços – 0,7%
  • Couro e derivados – até 0,6%

Com o anúncio da medida, frigoríficos em Goiás e Mato Grosso do Sul suspenderam o abate de bovinos com destino ao mercado americano. “Em algumas cadeias pode haver excesso de oferta no mercado interno, o que tende a reduzir pontualmente os preços para o consumidor brasileiro”, avalia Carla.

Enquanto frigoríficos brasileiros interrompem os abates destinados aos EUA com embarques previstos para agosto, os americanos adotaram a estratégia oposta: anteciparam as compras para garantir o abastecimento antes da entrada em vigor da alíquota.

De janeiro a junho de 2025, as exportações brasileiras de carne bovina para os EUA cresceram 112% em valor (US$ 1,287 bilhão) e 85% em volume (411,7 mil toneladas), em comparação ao mesmo período de 2024, segundo dados da Datamar News e do Beef Central.

“A antecipação mostra que os americanos tentam reduzir os impactos da alíquota no consumo interno. Mas é uma solução temporária. A pressão sobre estoques, especialmente de alimentos, vai crescer”, afirma Carla.

Empresas americanas pressionam contra a alíquota

Empresas dos EUA também têm se mobilizado contra a medida. Segundo a Bloomberg, uma distribuidora de suco de laranja estima que seus custos com o produto não processado do Brasil subirão US$ 68 milhões ao ano, com repasse de até 25% ao consumidor final no varejo.

“Trump acredita que pode forçar a reindustrialização interna. Mas o tempo de resposta agrícola não acompanha isso. Um pé de café, por exemplo, leva anos para produzir. Até lá, o mercado sofre — e o consumidor também”, aponta Troster.

Impactos no Brasil e caminhos possíveis

Apesar da reação setorial, Troster pondera que as exportações brasileiras aos EUA representam menos de 2% do PIB. “Não há risco de recessão. Os efeitos devem ser localizados.” Carla complementa: “Pode haver impactos nos preços, mas o mercado tende a se ajustar.”

Para ambos os economistas, o episódio reforça a urgência de uma política comercial mais multilateral. “O Brasil precisa reduzir a dependência de um único parceiro e ampliar relações com União Europeia, Mercosul, China e Oriente Médio”, diz Carla.

“O mundo está se reconfigurando. A influência americana diminui enquanto novos centros de poder se firmam. É hora de negociar em blocos”, afirma Troster. Eles também destacam que Trump já recuou em decisões semelhantes no passado, e que a pressão de grandes empresas pode forçar uma revisão da alíquota.

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