Todo ano, instabilidades de mercado e eventos climáticos — geadas, secas, enchentes, chuva na colheita, granizo, incêndios — geram prejuízos e pressionam o setor agropecuário. A resposta recorrente do governo é a prorrogação de dívidas.
Esse alívio imediato cria passivos que se arrastam por anos, trava crédito novo e reduz capacidade de investimento. O “sinal trocado” do governo — apostar em renegociações emergenciais em vez de prevenção estruturada — envia a mensagem errada ao setor e mantém produtores reféns de soluções de curto prazo.
Paliativos que custam caro
As soluções emergenciais apenas “resolvem” problemas momentâneos. Cada renegociação carrega consigo a perda de competitividade e a perpetuação do ciclo de vulnerabilidade e pobreza.
Além disso, existe o custo indireto das renegociações: ao carregar um passivo de dois a cinco anos, o produtor tem seu acesso a crédito e investimentos em tecnologia reduzido, sofre queda de produtividade e vê sua renda diminuir.
Sem a proteção do seguro rural, novas instabilidades exigem renegociações adicionais, empurrando com a barriga a situação, mascarando a inadimplência.
Histórico de improvisos
Desde os instrumentos financeiros criados na década de 1970, passando pela securitização e pelo Pesa nos anos 1990, a política agrícola brasileira tem privilegiado soluções paliativas. Grandes renegociações, como a Lei 11.775 de 2008, os ajustes frente às secas e geadas subsequentes e os problemas recentes no Rio Grande do Sul poderiam ter sido significativamente minimizados com a priorização do seguro rural.
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Décadas de medidas pontuais custaram caro aos cofres públicos e geraram efeitos negativos em toda a cadeia — do sistema financeiro a cooperativas, revendas, agroindústrias e produtores — mantendo vulnerabilidades estruturais e repetindo ciclos de fragilidade.
Falta decifrar a eficiência da Política Agrícola
É fundamental divulgar de forma transparente quanto cada instrumento — crédito rural, Proagro e seguro rural — realmente custa e qual é seu retorno efetivo. No caso do crédito rural, não basta considerar apenas os valores desembolsados, como se números recordes fossem sinônimo de sucesso.
É preciso avaliar também os benefícios e os custos indiretos associados ao crédito concedido sem garantias, que frequentemente resultam em prorrogações de dívidas, perdas de produtividade e renda e, em situações extremas, prejuízos ao patrimônio, recuperações judiciais ou até mesmo a saída do produtor da atividade rural.
Prevenir é melhor que renegociar
O contraste entre crédito e seguro rural é claro. Em 2021, cada R$ 1 investido em subvenção para o seguro gerou R$ 57 em importância segurada, enquanto o crédito rural gerou apenas R$ 7 em valor financiado.
Em 2024, R$ 600 milhões foram efetivamente liberados para o seguro rural, enquanto R$ 354 milhões permaneceram bloqueados no auge da contratação. Apesar de sua efetividade, o seguro rural ainda recebe recursos irrisórios diante dos bilhões destinados ao combo crédito rural, renegociações e Proagro, que somam mais de R$ 15 bilhões em subsídios.
O Zonamento Agrícola de Risco Climático (Zarc), da Embrapa, precisa de orçamento robusto para servir como base científica do seguro rural. Apenas com informações confiáveis, planejamento orçamentário previsível e políticas de prevenção estruturadas será possível transformar a política agrícola em um instrumento de resiliência, produtividade e competitividade, rompendo décadas de improvisação.
Neste momento, enquanto o governo federal define o orçamento do próximo ano, é crucial que a Lei Orçamentária Anual (LOA 2026) permita que o seguro rural atue de forma estruturante. Para mudar o jogo e dar à política agrícola a importância que merece, os valores bloqueados de R$ 354 milhões neste ano precisam ser liberados ainda em setembro de 2025 e o orçamento do PSR para 2026 deve prever R$ 3 bilhões estáveis e não contingenciáveis. Agora, a palavra está com o governo e com o Congresso Nacional.

*Pedro Loyola é consultor em gestão de riscos agropecuários e financiamento sustentável e coordenador executivo do Observatório do Seguro Rural da FGV Agro.
O Canal Rural e a FGV Agro não se responsabilizam pelas opiniões e conceitos emitidos nos textos desta sessão, sendo os conteúdos de inteira responsabilidade de seu autor. O Canal Rural se reserva o direito de fazer ajustes no texto para adequação às normas de publicação.
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